Frederico Bussinger: Codesa e o quebra-cabeça portuário

“Pelos frutos os conhecereis”(Jesus, Sermão do Monte)

Por: Frederico Bussinger  -  11/06/21  -  11:18
  Foto: Ilustração/Mônica Sobral/AT

Com a publicação da Resolução CPPI nº 188/2021, assinada pelos ministros Guedes e Tarcísio, ainda que ad referendum, o processo de desestatização (privatização) dos portos capixabas avançou mais uma casa: foi aprovada “a modelagem e condições de desestatização da Codesa e dos Portos Organizados de Vitória e Barra do Riacho”.


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O processo capixaba é importante de per si. Mas, ainda que as falas oficiais sejam na linha de que “não há um modelo nacional; haverá um arranjo diferente para cada desestatização; cada porto é um caso”, ele tem sido visto como uma pista do pretendido para os demais portos.


Um dos hits da quarentena é o bom e velho quebra-cabeças: lojistas o celebram; é o brinquedo oficial da temporada; e terapia contra isolamento e ansiedade. Os portos também montam o seu: um desses de milhares de peças!


É possível que o “mercado” esteja em estágio mais avançado nessa montagem, fruto dos “market soundings”. Mas, ainda que definições venham a público a conta-gotas (como com essa Resolução), uma análise sistemática lança luzes sobre mais aspectos do modelo: do fato de que, entre as alternativas previstas nos sete incisos do art. 4º da Lei nº 9.491/97, tenha sido escolhida a de transferência do controle acionário da Codesa – na venda (art. 1º), tem-se que o processo foca mais a empresa; de que essa transferência é associada à outorga do serviço; e, aparentemente, o modelo resultante não é nem o clássico landlord nem o tal modelo australiano. Atenção: não confundir com a concessão da Companhia Docas de Santos (CDS), pois ela incluía operações portuárias; o que, aparentemente, é vedado ao futuro concessionário (art. 3º; § 3º).


A resolução não trata da função autoridade portuária. Dessa omissão e da vedação para operar, pode-se deduzir que: i) o objeto da outorga é a administração portuária; ii) quem exercerá a função de autoridade, na prática, são as instâncias federais: Minfra e Antaq; hipótese reforçada pela criação de uma não desprezível taxa de fiscalização (art. 9º), com o que a agência passará a ter uma fonte permanente e regular de receita.


O critério de julgamento é o maior valor de outorga (art. 7º). Associado a que o lance mínimo beira meio bilhão de reais (art. 8º), deduz-se que o pressuposto assumido é que administração portuária é um negócio, não uma função. E um bom negócio! A dúvida segue sendo: como o concessionário será ressarcido? Haverá impactos sobre custos logísticos?


A vedação de participação de arrendatários e TUPs no controle da Codesa (art. 10) reforça a esperança de grandes investidores interessados. Haverá? Isso mesmo ante a notícia, divulgada ontem, de projeto de grande complexo portuário privado (R$ 1,7 bi), em Aracruz, ao lado de um dos “ativos” incluídos na concessão. Em paralelo, são ambos viáveis?


De investimentos, sempre apresentados como o principal motivador para a desestatização das autoridades-administradoras, a resolução não trata. Da relação do concessionário com arrendatários, tarifação, trabalho portuário e outras preocupações da comunidade, reveladas na audiência pública e nas contribuições formais, tampouco. Certamente constarão do edital e/ou da minuta de contrato. Mas, se a resolução visa definir “a modelagem e condições de desestatização”, não era de se esperar haver nela ao menos balizamentos para esses aspectos?


Mesmo que a conta-gotas, o quebra-cabeças vai se compondo, ainda que dúvidas pendam por ser dissipadas, inclusive uma preliminar – afinal, se consumado, quais dos problema portuários atualmente existentes esse modelo resolverá?


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